A criança que habita em mim não via a hora de chegar ao Rifugio Auronzo. Ela estava agitada, ansiosa por estar em seu parque de diversões preferido: as montanhas. Há poucas horas havia visto os primeiros carneiros pastando tendo como pano de fundo Os Alpes. Tinha guiado por uma estradinha sinuosa entre Cortina d’Ampezzo e Lago Misurina, onde a criança fez meu corpo saltitar de alegria – e depois registrar um saltinho tímido numa foto. Minha filha adolescente morre de vergonha quando faço isso, mas não ligo, a criança é mais forte que o mico, e um dia minha filha cresce e volta a ser criança, permitindo-se saltitar na alegria.

Se sua criança também curte saltitar em destinos de montanha, você vai entender minha cara de felicidade no alto do Rifugio Auronzo quando assistir ao filminho não profissional-super-caseiro-de-quem-só-usava-Movie-Maker-pra-fazer-retrospectiva-de-aniversário – cujo link está no final deste post. Eu não conseguia parar de sorrir. É isso o que as viagens fazem com a gente, principalmente naqueles destinos onde a gente se encontra com nossa criança interior.
O Lago Misurina
A estrada que liga Cortina d’Ampezzo até Misurina é, como todas as outras das Dolomitas, sinuosa e com vistas lindas de paredões rochosos. Vaquinhas pastando completam a experiência sensorial – não olfativa, como você pode pensar, mas auditiva: seus sinos badalam a ao movimento de suas cabeças ao comer ou ao posar para as câmeras dos turistas. Quando a estrada fica plana e reta, é inevitável parar para fotografar as montanhas Tre Cime di Lavaredo que se vêem ao fundo, como na foto acima. O prédio amarelo é um hospital, maior referência italiana para crianças asmáticas, instalado 1.750 metros acima do nível do mar e entre montanhas, lugar perfeito para quem tem doenças respiratórias e fome de paisagens lindas, mas me pareceu um tanto quanto silencioso demais. Acho que eu deveria ter ouvido ao menos uma tosse quando passeei em seus jardins, mas nada…


O lago é pequeno, tem menos de 3 km e uma trilha fácil, plana e com bancos para descanso ou apreciação o circunda, podendo ser feita por crianças e idosos sem problema. Além das Tre Cime, outras montanhas compõem a paisagem do lago: Cristallino e Sorapis, então é fácil encontrar motivos para fotografar em sua visita ao Misurina. Em dias claros e sem vento, infelizmente não foi o caso, as montanhas se duplicam nas águas e nos dias de inverno o lago de apenas 5 metros de profundidade congela e vira uma pista de patinação, tendo inclusive sido local das competições de patinação de velocidade nas Olimpíadas de Inverno de 1956, que aconteceram em Cortina d’Ampezzo.



Além de caminhar, relaxar, fotografar e admirar a paisagem, há um teleférico que chega ao Rifugio Col de Varda, a 2.106 metros de altitude, e que deve dar uma bela vista panorâmica do lago e das montanhas próximas, mas estava fechado no dia em que estive lá.
Leia os outros posts sobre as Dolomitas, cujos links estão no final deste.
Senta que lá vem historia
Misurina era, segundo a lenda e a Wikipedia, a neta (ou filha, de acordo com outra fonte) mimada de um amado e generoso rei, que se rendia a seus impulsivos caprichos. Um dia Misurina ouviu dizer que uma bruxa que vivia numa montanha próxima possuía uma espelho que permitia a seu dono ver tudo o que acontecia no mundo. Misurina esperneou e fez tanta birra que o bondoso rei foi ter com a bruxa, que barganhou a troca transformando-o em uma montanha (a Sorapiss!) para sombrear sua horta de ervas. Ao descobrir o sacrifício de seu amado avô, Misurina chorou tanto que encheu um rio – ou um lago – de lágrimas. E o espelho? Ninguém me contou, mas acho que são as lágrimas depositadas no lago que refletem o mundo no Misurina.
Eu escolhi ficar no Lago Misurina pela paisagem, embora a de Cortina d’Ampezzo também seja linda, mas me preocupava saber se haveria restaurantes abertos à noite para o jantar, já que estávamos fora de temporada se só há uns 10 edifícios ali no lago. Então fizemos umas comprinhas em Cortina: frutas, queijos, pães e vinho, mas há hotéis que servem também não hóspedes, descobri lá.
Bem, não me lembro que horas eram, mas devia ser perto das 15h quando fizemos o check in no Hotel Sorapiss rapidamente e voltamos ao nosso carrinho para subir ao Rifugio Auronzo.
Sobre aluguel de carro na Itália e dicas de direção por lá, leia Dirigindo na Itália

Onde ficamos no Lago Misurina
O Hotel Sorapiss é simples, mas aconchegante, com vista para o lago e com atendimento simpático e atencioso, motivo principal da minha indicação a você. Se quiser pesquisar outros hotéis no Lago Misurina, clique aqui.


A decoração está desatualizada, mas tanto o quarto quanto as áreas sociais eram bem aconchegantes e eu fiquei imaginando aquela sala com lareira no inverno, tudo branquinho através das janelas…

Rifugio Auronzo
Pra começar, o que são rifugios? Refúgio são acomodações simples no alto de montanhas, que servem de pousada para quem está fazendo trilhas longas, de vários dias, mas qualquer um pode solicitar reserva, que deve ser feita com muita antecedência, em geral. A maioria possui quartos coletivos com beliches, mas há quartos para 2 ou 4 pessoas, também. A maioria serve refeições e as mesas ao ar livre são disputadíssimas em dias quentes. Eu não entrei no Rifugio Auronzo porque a paisagem do lado de fora era hipnotizante e eu não conseguia desgrudar os olhos dos picos.

Quem viaja por estas bandas o que vai mais fazer é encontrar refúgios e o que é bacana é o fato de muitos serem acessíveis por carro ou teleférico, diferente de outros parques nacionais onde são exclusivos para quem faz trekking ou escaladas. Claro que a sensação de conquista é inexistente, pois não há esforço algum envolvido, mas a vista, ah, a vista…

Chegar ao Rifugio Auronzo foi muito fácil. Dirigi a partir de Cortina d’Ampezzo, onde cheguei ainda mais facilmente vindo de Veneza (leia as dicas no post Cortina d’Ampezzo), onde almoçamos. Uma breve parada no Lago Misurina para fazer o check in no Hotel Sorapiss, onde me informei sobre o Rifugio, e tomamos a estrada no final do lago. Pouco depois de começar a serra, há uma guarita para pagar a taxa de €18 pelo estacionamento (algo inexistente em outros rifugios que visitei nas Dolomitas) e ao lado, mais vaquinhas pastando.

Mas o bucolismo vira suspense pela ausência de guardrail em alguns pontos da sinuosa e estreita estrada. Mas logo se avista o grande estacionamento, no alto da montanha e o refúgio.
Minha colega de viagem, Miriam, tinha ficado no carro, mas eu fui buscá-la porque não é possível alguém ir até ali e não ver aquela paisagem! Depois de umas fotos ela retornou para o calor do carro e eu fui “só até ali” 😉
Caminhei em direção a uma capelinha – algo também sempre presente nos vales e passos – que fica na trilha que parte do rifugio. Não sei quanto tempo caminhei, mas se ela não estivesse me esperando eu teria ficado mais.
Esse foi o primeiro contato com as montanhas nesta viagem aos Alpes Italianos, e estar pertinho delas, com direito a vento frio no rosto, isolamento e quietude trouxe um prazer imenso. As montanhas são minha praia e é nelas que me sinto bem, de corpo e alma. And nothing else compares!
Acesse o canal do blog Mulher Casada Viaja no YouTube onde compartilhei minha alegria de estar nas montanhas.
Posts Relacionados às Dolomitas (clique sobre o título)
– Dirigindo na Itália
– Cortina d’Ampezzo
– Dolomitas: roteiro de 3 dias
– Roteiro de 12 dias pelo Norte e pela Toscana
– Dolomitas: guia para planejar sua viagem
– Alpe di Siusi
– Val di Funes
Em que época você foi para as Dolomitas? Melhor abril ou julho para aproveitar as caminhadas? Linda viagem e ótimo relato.
Mais uma coisa: esse hotel é ok para alérgicos? (Quero dizer, não tem cheiro de mofo?). Obrigada
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Oi, Luciana, obrigada pelo comentário. Com certeza Julho. Neste ano em maio ainda tinha muita neve no Lago Misurina.
Olha, não senti cheiro de mofo, não, em nenhum hotel em que ficamos. E estava tempo bem úmido. Bom planejamento pra vc!
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Oi Marcia, tudo bem? Você foi no Tre Cime di Lavaredo? Pra ir até lá é através desse Rifugio? Tem que fazer trilha? É longa? Pois vou estar com crianças. São muitas dúvidas…rs. Obrigada!!!
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Oi, Mari, não infelizmente não fiz, só percorri um trecho próximo ao Rifugio. Você leu este post ?https://mulhercasadaviaja.com/2016/08/09/dolomitas-guia-para-planejar-sua-viagem/
Nele tem informações de trekking e link para um site sobre várias trilhas: https://www.summitpost.org/tre-cime-di-lavaredo-drei-zinnen/150212
Agora, você vai estar com crianças, elas vão fazer trekking? O que vc pode é fazer como fiz, subir de carro até o Rifugio Auronzo e caminhar um pouco. A trilha ali é bem fácil – e lindo visual! Vamos nos falando, fiquei curiosa!
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Nem as crianças e nem eu vamos fazer trekking rsrsrs. Vou seguir seu conselho, subir de carro e aproveitar o visual!!! Obrigada!😉
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Aquele predio amarelo fica uma escola para criancas com problemas respiratorios. Minha filha estudou la por varios anos.
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Funciona escola, também? Pensei que fosse apenas hospital. Imagino que ela ficou bem depois de viver num lugar assim!
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