Nosso fiel escudeiro, o motorista do remisse Jose, nos deixou em frente ao Centro Cívico, para que eu pudesse fotografar o nascer do dia. Como valeu a pena ficar no frio daquela manhã de fim de junho observando as cores do céu em tons pouco comuns, pelo menos para quem como eu mora em SP. Apesar disso, o dia se revelou cinzento e frio e o passeio ao Parque Nacional Nahuel Huapi para ver a geleira negra do Cerro Tronador não rendeu fotos tão lindas como poderia, então não desanime de fazer o passeio tendo por base as fotos. E escolha um dia de sol, se possível. Ele trará mais cor a tudo.
O passeio tem início às 9h e como toda excursão tem aquela parte chata de pingar de hotel em hotel, mas como era apenas uma van, ou seja, poucas pessoas no grupo, não perdemos tanto tempo. O caminho é sem grandes atrativos e logo cruzamos a portaria do Parque Nacional, onde devemos pagar a entrada. Um funcionário do parque entra no ônibus e cobra a taxa de 100 pesos por pessoa. Crianças abaixo de 12 anos não pagam. Eu já visitei parques nacionais no Brasil, Chile, Canadá e nos Estados Unidos e agora, na Argentina, foi o único país em que a cada dia que entrei precisei pagar uma nova taxa. E não recebemos nenhum mapa, nenhum panfleto. Nada. Perguntei à guia e ela disse que há algum tempo já não distribuem mapas na entrada.
A van faz algumas paradas para fotos em alguns pontos, como este da imagem abaixo, em que aparece em primeiro plano a rosa mosqueta, nativa da região e da qual você provavelmente já ouviu falar. Sua maior eficácia diz respeito à cicatrização, mas além de óleos há cremes, perfumes e até chá. Se quiser provar, vá em frente, mas eu não gostei.
Às 10h40 fazemos a primeira parada com estrutura de cafeteria e sanitários, em Los Rapidos, à beira do Rio Manso. A região é lindíssima e há trilhas que provavelmente são muito usadas no verão.
Ao meio dia paramos em um mirante em frente à Ilha Piuqué Huapi, que significa coração na língua mapuche, mas a forma só pode ser vista para quem se aventura na trilha de umas 8 horas de duração do outro lado do rio. O nome deste lindo lago da foto abaixo é Mascardi e sua ilha envolve uma lenda ao estilo Romeu e Julieta. Interessante como a temática de algumas historias se repete em diversos povos, mesmo com tantas diferenças culturais e regionais. Dois jovens, Lilen e Ayopan, de tribos diferentes e inimigas se conhecem, se apaixonam, mas são impedidos de praticar seu amor. Resolvem então fugir, na primeira noite de lua cheia. Os guerreiros os perseguem e a jovem Lilen é atingida no ombro por uma flecha, caindo no lago. Desesperado, Ayopan salta para salvá-la, mas é atingido por outra flecha bem no momento em que a abraça. A flecha perfura o corpo do rapaz e atinge também o de Lilen, unindo-os pra sempre nas profundezas do lago, no exato lugar onde surgiu a ilha em forma de coração. Eu sempre gostei de lendas indígenas e acho delicioso ouvir uma assim, in loco.
Por falar em historias e lendas, acho que ainda não contei em nenhum post sobre a origem do nome Bariloche, então vamos lá: essa região do lado Leste da cordilheira (ou seja, do lado argentino) era chamada de Vuriloche, que significa “gente do outro lado da montanha”, na língua mapuche. Assim como no Brasil há certa confusão entre os fonemas bassoura-vassoura, basculante-vasculante, Vuriloche acabou sendo registrada pelos colonizadores como Bariloche.
Todo o percurso é feito em uma estrada estreita e de mão única, então no período da manhã só se guia em direção à geleira do Tronador e depois das 16h só se desce.
Ainda no Lago Mascardi, algumas das vistas mais lindas de todo o passeio:
Às 12h30 chegamos a Pampa Linda, onde há uma hosteria com a melhor vista do Tronador (sem contar a do Cruce Andino no lado Chileno, que é fantástica!), e de onde saem algumas trilhas. É ali que almoçamos. Você faz o pedido no balcão e recebe uma senha, que é gritada para que você retorne ao balcão e retire seu pedido. Se você assistia Sielfeld como eu, vai se lembrar do The Soup Man: “No Soup for You!”. Eu devia ter ouvido esse pensamento… Há poucas opções, como você pode ver na foto abaixo. Não dei sorte no pedido e acabei furtando uma empanada do maridão. Não sei como alguém pode errar ao fazer uma sopa de legumes! Sério, não tinha gosto de nada, eram legumes cozidos numa água sem qualquer tempero. Quando fui ao banheiro, outro susto: um dos sanitários estava sem porta e não havia água aquecida nas torneiras (desculpe, mas aqui isso não é luxo, é necessidade), ou seja, vi um monte de gente saindo do banheiro sem lavar as mãos. Também não havia toalhas para se enxugar as mãos e o sabonete era de barra. A Nojinho do Divertidamente apertou seus botões, mas eu usei assim mesmo. Afinal, sabonete líquido e espuminha são invenções mais recentes, sabe?
É comum haver propriedades particulares dentro dos limites de parques nacionais, que foram criados depois de essas famílias se estabelecerem ali, e é justo que não sejam expulsas de suas terras ou “indenizadas” (sei bem como acontecem essas indenizações). Mas se estas famílias se prestam a oferecer serviços aos turistas dentro de um parque nacional, deveriam seguir algumas diretrizes de higiene e qualidade.
Outra crítica ao parque é que achei injusto pagar 100 pesos por pessoa a cada visita. Em termos comparativos, a entrada no Yosemite Park na Califórnia ou no Grand Canyon custa US$ 30 por uma semana por veículo (e tem banheiro até na trilha Bright Angel). Para Torres del Paine no Chile, são US$ 66 por pessoa por três dias. Além disso, não vi um sanitário ou ponto de apoio ao turista administrado pelo parque nacional. Todos os pontos onde paramos eram particulares. Nem um mapinha foi entregue (esse eu não perdoo, adoro um mapinha – rsrsrs). Por outro lado, a estrada estava em bom estado, mas não entendo porque não pavimentá-la. Se você pensar, é muito custo para o retorno estrutural que o parque oferece.
Às 14h retornamos à estrada e percebemos que o solo fica ainda mais escuro, devido à proximidade com o vulcão. São 7 quilômetros até chegarmos à geleira Ventisquero Negro. O Cerro Tronador é um vulcão, tem 3.491 metros de altura e possui três cumes: o argentino, o chileno e o internacional, que delimita a fronteira. Além disso, abriga sete geleiras e quando há desprendimento de gelo produz-se um som alto e grave como um trovão, daí o nome Tronador.
Depois de ver geleiras como a Perito Moreno, no Sul da Argentina, e a Athabasca, no Canadá, a visão da geleira Vestiquero Negro não impressiona tanto, mas ela tem uma carta na manga: como a geleira se forma no vulcão, o gelo que se desprende se mistura à rocha vulcânica e produz este efeito marmorizado. Mas o que mais me impressiona quando visito geleiras é saber o quanto elas perdem em volume ao longo dos anos. Em 1942, a Vestiquero Negro alcançava a área onde hoje está o mirante, que agora é lago onde flutuam os icebergs.
Às 14h50 deixamos a geleira e fazemos o caminho de volta, desta vez sem paradas. Li em outros blogs que a partir deste ponto, se você não está em excursão, pode caminhar mais um quilômetro para acessar outro mirante.
Preços (em pesos argentinos em Julho/2015)
excursão: 560
entrada no parque: 100 por pessoa
Onde comprar
Como fizemos os passeios pelos lagos a convite da Turisur (não deixe de fazer, são lindos!), foi lá também que fechamos este passeio. Há duas lojas no centro de Bariloche: na Mitre 219 e na Villegas 310. Reservas podem ser feitas pelo site da Turisur, clique aqui.
Avaliação
A guia demonstrou conhecer bem a flora e a história da região e respondeu prontamente às perguntas do grupo. A van estava limpa e aquecida, mas seus assentos eram muito estreitos e meu marido que é alto sentiu desconforto. O tempo nas paradas só é suficiente para fotografar rapidamente e ouvir alguma explicação da guia. Se quiser explorar, caminhar ou mesmo fotografar com calma precisará ir por conta. Muitos consideram este o melhor passeio de Bariloche. Talvez eu não tenha achado porque o dia estava muito fechado e frio e as cores dos lagos não estavam tão vívidas. Ou talvez porque para mim, conhecer um lugar é mais do que passar de ônibus, parar para fotografar e voltar ao ônibus. Se você é do tipo que fica satisfeito em ver, sem necessariamente vivenciar, a excursão te atenderá perfeitamente e você sairá dela mais feliz do que eu. O almoço certamente foi o ponto baixo.
Dicas
⛅ É sempre muito frio perto de geleiras, então agasalhe-se bem. Não é preciso roupas ou calçados impermeáveis se não estiver nevando ou tiver nevado.
? Leve um lanche para almoço. A alimentação em Pampa Linda é realmente muito ruim.
? Se conseguir, sente-se à frente da van para ver a paisagem pelo vidro frontal e, principalmente, para descer primeiro e fotografar a paisagem antes que os mirantes se encham de gente.
Respostas de 3
Olá! Já tinha falado com vc em outro post! Mas sim, gostaria de saber sobre os restaurantes/supermercados de Bariloche e sobre o circuito chico! Obrigada!