Eu o conheci em minha primeira viagem a Veneza, em 2013. Nada mais romântico, você deve imaginar, mas não foi bem assim. Eu viajava com minha mãe, meu marido e minha filha, então tenha certeza de que foi impossível ficarmos juntos.
Ainda custo a acreditar que em meio à multidão que circula no entorno da Praça de São Marcos escolhi justamente ele. Italiano, sim, mas aparentemente nada diferente de tantos outros, um clássico veneziano. Gosto de clássicos, típicos. Foi assim com um mexicano, um alemão e até um chinês, quem diria… No pouco tempo que ficamos juntos em frente ao Grande Canal, enquanto gôndolas iam e vinham e turistas se acotovelavam para fotografar a Ponte dos Suspiros, percebi que ele não tinha nada de especial. Ou talvez tenha sido a forma que encontrei de acabar o que nem havia começado, uma justificativa para meu impedimento. E me despedi. Na verdade, não foi assim tão fácil e logo que deixei Veneza percebi o erro. Dizem que a gente deve se arrepender pelo que fez e não pelo que deixou de fazer…
Acho que quando viajamos precisamos de um tempo para absorver as experiências vividas. Eu só me apaixonei por Amsterdam quando voltei pra casa e comecei a escrever sobre a cidade – ou talvez tenha percebido o quanto é especial só então. Com o italiano foi a mesma coisa. Não escrevi sobre ele e só agora torno a coisa pública. O fato é que nesses dois anos eu sempre pensava nele e me arrependia por não termos compartilhado mais momentos juntos. Prometi a mim mesma que voltaria e o procuraria.

Voltei a Veneza em 2015, chegando numa tarde junto com uma chuva de verão, embora fosse primavera. E chega a doer lembrar como os barcos são lentos! Eu olhava os water taxis, mais velozes (e mais caros), com vontade de pular em um deles, certa de que os italianos entenderiam minha urgência, com sua fama de bons românticos e apreciadores de histórias de amor.

O céu escureceu conforme o barco se aproximava de San Marco e chuva e noite chegaram juntos. Tentei encontrá-lo no mesmo local onde o vi pela primeira vez, mas sem sucesso. “Cheguei tarde”, pensei. Caminhei pelo labirinto de ruas e parecia que todo mundo estava em Veneza acompanhado. É o mesmo quando você quer engravidar e não consegue: só vê barrigas enormes pela frente. Ou quando eu ia pra faculdade {as sextas-feiras depois de um dia inteiro de trabalho e só via mochileiros indo viajar.

Voltei ao hotel, mas mal consegui dormir tamanha era minha expectativa. Será que o acharia na manhã seguinte? Nosso encontro dois anos antes havia sido tão fugaz e eu apenas sabia que ele costumava ficar em frente ao Grande Canal, entre o Palazzo Ducale e o monumento a Vittorio Emanuele II. Você não vai acreditar: acho que o estresse foi tão grande que quando eu finalmente dormi, o sono só me deixou às 10h. Grande pecado, pois se hospedar em Veneza tem a vantagem de estar em Veneza antes que ela seja invadida por todos os outros turistas que não dormiram em Veneza. Além, é claro, de ter perdido horas que poderiam ser vividas com o italiano. Me vesti apressadamente, mas com cuidado para causar impacto. Atravessei a Praça de São Marcos e tudo e todos pareciam invisíveis. Basílica, Campanário, Torre do Relógio, pombos e gentes não me interessavam. Só existia o chão à minha frente, a ser vencido por meus passos. Eu os contava em cadência com os batimentos cardíacos e ambos intensificavam-se maior a proximidade com o Grande Canal. Meu estômago abrigava um borboletário inteiro, mas quando o encontrei tudo mudou. Eu não tinha dúvidas, só certezas. E lá estava ele!
Era meu único dia em Veneza e na manhã seguinte partiria. Cenário e situação perfeitas para um romance hollywoodiano, daqueles inocentes dos anos 1950s, cheio de intenções, mas velado. Passeamos pelas ruas estreitas admirando igualmente as flores nas janelas ou roupas nos varais, afinal, ambas coloriam os tons terrosos da cidade. Para almoçar, sentamo-nos em uma dessas mesas exíguas que ficam sobre sacadas debruçadas em canais pequenos e tranquilos. Cruzamos pontes e mais pontes e, quando meu dia parecia estar perfeito, aconteceu: um vento soprou e…
…levou embora meu chapéu veneziano!
Sinto muito se você pensou que eu estava tendo um romance com um italiano – ou não! A ideia era essa mesmo. Mas não menti em nenhum momento, a história é real. Não comprei o chapéu veneziano de gondoleiro em minha primeira viagem a Veneza, mas não perdi a chance desta vez. Explico: adoro chapéus e tenho uma pequena coleção de mexicano, alemão, chinês e agora esse italiano lindão. Eu não comprei um na minha primeira viagem a Veneza, mas não o esquecia. E quando o reencontrei quis trazê-lo pra casa, mas ele realmente voou, caiu em um canal. E aí vem outra história, mas essa eu conto quando falar sobre meu roteiro de dois dias em Veneza.
